sexta-feira, 30 de setembro de 2022

 


DISLEXIA- UM CASO DE SUCESSO


O que é dislexia?

Dislexia é um transtorno genético e hereditário da linguagem, de origem neurobiológica, que se caracteriza pela dificuldade de decodificar o estímulo escrito ou o símbolo gráfico. A dislexia compromete a capacidade de aprender a ler e escrever com correção e fluência, e de compreender um texto. Em diferentes graus, os portadores desse “defeito” congênito, que prefiro nomear como uma “claudicância”, não conseguem estabelecer a memória fonêmica, isto é, associar os fonemas às letras.

 

Quais os sintomas?

Os sintomas de dislexia variam de acordo com os diferentes graus de gravidade do distúrbio e tornam-se mais evidentes durante a fase da alfabetização. Entre os mais comuns encontram-se as seguintes dificuldades:

 

*Para ler, escrever e soletrar;

*De entendimento do texto escrito;

*Para de identificar fonemas, associá-los às letras e reconhecer rimas e aliterações;

*Para decorar a tabuada, reconhecer símbolos e conceitos matemáticos (discalculia);

*Ortográficas: troca de letras, inversão, omissão ou acréscimo de letras e sílabas (disgrafia);

*De organização temporal e espacial e coordenação motora.

 

Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico é feito por exclusão, em geral por equipe multidisciplinar (médico, psicólogo, psicopedagogo, fonoaudiólogo, neurologista). Antes de afirmar que uma pessoa é disléxica, é preciso descartar a ocorrência de deficiências visuais e auditivas, déficit de atenção, escolarização inadequada, problemas emocionais, psicológicos e socioeconômicos que possam interferir na aprendizagem.

O diagnóstico de dislexia não significa que a criança seja menos inteligente; significa apenas que é portadora de um distúrbio que pode ser corrigido ou atenuado, e essa observação é de grande relevância, pois trazendo a grande máxima das Inteligências Múltiplas de Howard Gardner, desenvolvemos nossas habilidades em maior ou menor intensidade a partir de nossas vivências e focos de interesse, dando notícias de que não se trata de “o quanto o sujeito é inteligente”, mas “como ele pode ou consegue apreender”.

 

 Como é realizado o tratamento/ acompanhamento?

O tratamento da dislexia pressupõe um processo de médio ou longo prazo que demanda persistência. Ainda não se conhece a cura para a dislexia mas a maioria das crianças com dislexia pode ter sucesso na escola com tutores e programas de educação especializados com a  participação de especialistas em várias áreas (pedagogia, psicopedagogia, psicanálise, fonoaudiologia, psicologia, etc.) para ajudar o portador de dislexia a superar, na medida do possível, o comprometimento no mecanismo da leitura, da expressão escrita ou da matemática.

 

Mas o que se descortina por trás do transtorno?

A dislexia pode ser também um sintoma na vida da criança, sintoma que trás com ele um valor de linguagem segundo o psicanalista Jacques Lacan. A abordagem psicanalítica pode sim contribuir valorosamente para a evolução da criança, considerando que não apenas ela, mas que também a família possa ser ouvida. Uma escuta do inconsciente desta criança, entrevista com os familiares, análise da linguagem pela qual essa criança está perpassada, utilização de estratégias lúdicas e contribuições da psicomotricidade, podem colaborar com a evolução deste paciente, pois irá ajuda-lo a lidar com as questões que permeiam o seu “eu” e os espaços que o circundam.

 

Um caso de sucesso:

Como dito inicialmente, um tratamento desta natureza demanda tempo, paciência e acima de tudo respeito à singularidade desta criança. M.A (nome fictício) 10 anos, chegou ao consultório no ano de 2018 com comprometimentos severos de aprendizagem. Foi necessário realizar várias entrevistas com a mãe, enfim, uma longa anamnese. O acolhimento desta criança que trazia consigo uma história muito peculiar, observações cuidadosas, orientações familiares, visitas à escola e muita, muita ludicidade na clínica de forma a motivar e despertar nesta paciente um desejo de saber, com a finalidade de fazê-la resgatar sua autoestima, e então desta forma encontrarmos juntas caminhos que possibilitassem avançar, que viabilizassem a superação de suas dificuldades.

Num belo dia, de forma inesperada, ela me pede para usar o quadro de giz para escrever alguns nomes. Primeiro foram os nomes, depois as frases e tudo foi tomando forma. A cada palavra que ela “desenhava”, pois pra mim me pareceu mesmo a inspiração de uma grande artista, a alegria me invadia.


Depois dos nomes sugiro frases, e ela, sem hesitar as escrevia ainda apresentando algumas pouquíssimas dúvidas com sílabas mais complexas. MAS ELA CONSEGUIU! O registro está nas fotos. Eu a via com um sorriso enorme, um brilho nos olhos que me fez pensar o quanto sou feliz por ter o privilégio de ajudar crianças com transtornos de aprendizagem, e ver resultados tão surpreendentes e maravilhosos. Chamei a mãe que estava aguardando na sala de espera e disse “Veja você mesma, sua filha está lendo e escrevendo!” A mãe se emocionou, eu saltitei de alegria e aquela menina linda que sempre me dizia a cada sessão “Tia, eu ainda vou aprender a ler e escrever”, era a expressão da pura satisfação, era só orgulho de si em ver sua dedicação recompensada nas palavras e frases que acabara de escrever. E parafraseando com imenso respeito uma linda obra de Ruth Rocha, uma escritora infantil que merece todo o meu respeito, eu posso dizer que essa é uma história da “A Menina que Aprendeu a Ver”. Nos abraçamos e choramos juntas. Foi emocionante!!!

A história de M.A está só começando, sabemos bem disto, mas quando não se pode voltar atrás e refazer o passado, podemos seguir adiante e construir uma nova história. E foi isso que conseguimos realizar juntos, a criança, sua família e o profissional. Porque só se pode ser autor de histórias transformadoras na clínica quando entendemos que essa “tríade” paciente- família- profissional é primordial.

Os créditos também se estendem à equipe Multidisciplinar que atuou no Espaço Multidisciplinar Vida Plena, na cidade de Valença, interior do Rio de Janeiro,junto ao meu trabalho de Psicopedagogia e Psicanálise, como o médico clínico, o fonoaudiólogo e a neuropsicopedagoga. Uma equipe que não mediu esforços para se reunir e discutir o caso, que afinava e acordava as intervenções, que trocava muitas ideias e dividia também suas angústias com as dificuldades e intercorrências ao longo do tratamento, mas no final o resultado é gratificante, ético e profissional.

Essa é a prova da eficácia de uma equipe desta natureza. Um bom profissional nunca trabalha sozinho. A troca é primordial e necessária.

Enfim, este é um caso com um final que desejamos. DISLEXIA- Um caso de sucesso!

 

Professora Me. Andréa Pinheiro Bonfante- Psicanalista, especialista em Psicopedagogia.

Mestre e Doutoranda em Psicanálise, Saúde e Sociedade, pós-graduada em psicanálise, pós-graduada em psicopedagogia, graduada em Letras, autora do livro “A Psicanálise e a Clínica do Autismo Infantil”, sócia do Espaço Vida Plena.

 

 

Referências bibliográficas:

 

www.drauziovarella.uol.com.br

 

bases.bireme.br

 

www.dislexia.org.br