Psicanalista Mestre e Doutoranda em Psicanálise

quinta-feira, 8 de junho de 2017

Autismo à Luz da Psicanálise


Trabalhar com pacientes portadores do Espectro do Autismo tem sido um grande desafio e aprendizado. Meus pacientes autistas me ensinam diariamente que formas diferentes de se comunicar são possíveis e que o tempo não é fator determinante, que ele é  sim subjetivo e que atende as demandas da criança e não do profissional que o atende. Que a forma como o trabalho irá ser conduzido é diariamente sinalizado por ela, a criança, e que cabe ao profissional ficar atento as suas idiossincrasias e singularidades dentro de uma enorme pluralidade de possibilidades. 


A tão renomada médica psiquiatra Nise da Silveira nos deixou um grande legado, o de estar atento ao "suposto silêncio" de nossos pacientes. Sua forma de agir, mesmo sem proferir sequer uma palavra, nos dá pistas sobre como secretariá-lo, pois é disso que se trata, secretariar, ir ao lado, nem à frente, tampouco atrás. É buscar e proporcionar aquilo que lhes falta, o olhar. Pois é essa a grande questão dos portadores de autismo, a linguagem. O olhar, o corpo, o gesto, a voz, são formas de se comunicar com essa criança que justamente não sabe como fazer para dar voz as suas demandas e nem como barrar tudo aquilo que muitas das vezes lhes é extremamente "intrusivo", como os sons, sensações e emoções. 

Tudo o que vem de fora "invade" esse corpo que ainda não fez borda, isto é, que não entende nem percebe seus limites e o do outro(s) com o(s) qual/ quais convive. São várias as formas de interação; lhes apresentar sua imagem no espelho, pular e dançar, fazer cócegas, estimular a sensibilidade oferecendo materiais sensoriais para estimular o tato, a audição, a visão, o olfato, o paladar; ouvindo músicas, assistindo a um vídeo, fazendo um piquenique, levando-os ao parquinho, encher balões, lidar com guache e massinha, lhes apresentar um animalzinho de estimação como um cachorrinho, convocar a família ao "setting", brincar de esconde- esconde, abrir e fechar portas, enfim... se fazer de instrumento dessa criança e criar laços afetivos com ela. Não há fórmulas pré estabelecidas, nem tampouco prazos para cumprir. 

O que há na
verdade, é um grande investimento do profissional, uma participação da família, um trabalho multidisciplinar com a instituição escolar e outros profissionais, e a tranquilidade de perceber que para uma melhor qualidade de vida, a criança autista deve estar sempre sendo estimulada e incluída em rodas sociais, sejam elas na escola, no esporte, ou quaisquer outras. Sem preconceito, com muito esclarecimento e acima de tudo o amor, a criança autista pode sim ter uma boa qualidade de vida e se constituir um adulto autônomo e sociável.
Andréa Pinheiro Bonfante (Psicanalista e Psicopedagoga)