Psicanalista Mestre e Doutoranda em Psicanálise

segunda-feira, 17 de abril de 2023

-A PSICANÁLISE E AS DEFICIÊNCIAS INVISÍVEIS- (TEA- Transtorno do Espectro Autista)

 

-A PSICANÁLISE E AS DEFICIÊNCIAS INVISÍVEIS-

TEA- Transtorno do Espectro Autista



***O artigo trazido aqui, é resultado do estudo promovido no curso "Psicanálise e Autismo" no segundo semestre de 2022,coordenado pela Professora Mestre e Doutoranda em Psicanálise Andréa Pinheiro Bonfante e o aluno de psicanálise em formação José de Ribamar Santos Souza, em parceria com o Instituto de Psicanálise IBRAPCHS-RJ.

O que a psicanálise tem a dizer sobre o desenvolvimento de um sujeito com autismo? 

Quando um
Autista sorrir para você, é porque ele realmente viu alegria em você, se tentar
te abraçar é porque ele sentiu acolhimento em
teus gestos. Se ele procurar o teu olhar, se orgulhe! Ele está fazendo um
grande esforço para tentar te conhecer. 

Os Autistas
têm
muito mais a nos ensinar sobre a pureza e a sinceridade, do que possamos
imaginar. O autismo é considerado uma deficiência invisível, ele não pode ser
percebido pela fisionomia de uma pessoa e não limita a inteligência, por trás
de um autista que não parece autista, está muita luta e muita dor. 

Palavras – chave: Psicanálise, Autismo, Deficiência, invisível


A PSICANÁLISE E AS DEFICIÊNCIAS INVISÍVEIS




O CORDÃO DE GIRASSOL


Fazendo uma articulação do autismo com as deficiências invisíveis, podemos falar sobre o girassol que é um símbolo globalmente reconhecido para comentar sobre essa “invisibilidade”, também conhecida como deficiência oculta. 


A escolha de um girassol para representar essa peculiaridade foi proposital, pois sugere felicidade, positividade, força, bem como crescimento e confiança, sendo ele universalmente conhecido.

Nem todas as deficiências são visíveis, algumas são imediatamente óbvias.  Dentre as não óbvias temos Transtorno do Espectro Autista (TEA), o Transtorno do Déficit de Atenção (TDAH), dislexia, deficiências auditivas e visuais parciais dentre outras.

Elas também incluem condições respiratórias, condições de doenças crônicas como diabetes e tantas outras condições que não podem ser identificadas no olhar, pois embora você não consiga ver essas deficiências e condições invisíveis, elas ainda estão lá.

As pessoas que convivem com essa realidade, muitas vezes enfrentam barreiras em suas vidas diárias, incluindo falta de compreensão e atitudes negativas. Por isso, alguns optam por usar um cordão Girassol para identificar discretamente que podem precisar de apoio, ajuda ou apenas um pouco mais de tempo para se adequarem em lugares públicos, lojas ou transportes.

Especificamente sobre o autismo o símbolo globalmente reconhecido é o quebra cabeça que fala sobre a subjetividade de cada sujeito, tal como uma colcha de retalhos, o quebra cabeça fala de algo a ser construído. Voltando ao título de nossa introdução, a psicanálise propõe um olhar e uma escuta atenta e diferenciada para aquilo que se configura a princípio. É como desvelar aquilo que aos olhos do senso comum esteja invisível.

 

BASEADO EM FATOS


O caso que trago aqui tem como nome fictício Aurora que conheci através de um projeto cultural e como aluno de formação em psicanálise, dediquei-me à observação do caso. Aurora foi diagnosticada com Autismo tardiamente, aos 10 anos por uma equipe multidisciplinar. Frequentou a escola, chegou à vida acadêmica e realizou alguns cursos complementares, como idiomas, pintura e informática. Não faltaram dificuldades no percurso, mas a maior delas foi a falta de orientação sobre como criar seu próprio caminho. Aurora hoje tem 24 anos, gosta de interagir com pessoas e animais, tem um trabalho fixo e namora um rapaz que conheceu em uma rede social, dando-nos notícias de que um portador de TEA pode ser funcional e construir sua própria história.

A importância da atenção individualizada no desenvolvimento de uma criança, ainda bebê, precisa ser levada em consideração e a não atenção devida aos fatos pode vir a comprometer seu desenvolvimento. Aurora não foi percebida, nem pelos seus pais, que havia algo diferente em seu desenvolvimento, nem mesmo pela pediatra que a acompanhava. Uma parente mais próxima foi quem notou que Aurora precisava de uma atenção individualizada, procurou a pediatra e fez alguns questionamentos. Não obteve muito progresso e insistiu com a família que a menina precisava de um acompanhamento de profissionais capacitados, e durante cinco anos a menina fez terapia sem a anuência do pai. Mesmo tendo o acolhimento da vó materna, a mãe de Aurora, em um processo inconsciente e procurando agradar seu marido, visita diversos profissionais acreditando que pudesse ter um erro em um dos laudos, pois o pai não aceitava uma filha com o que ele nomeava “defeito”, já que tinha idealizado uma filha perfeita, e vive um eterno conflito entre aquilo com o que sonhou e idealizou. O pai ainda hoje vive o luto da filha idealizada, dificultando, de alguma forma, as relações entre os dois

Durante sua adolescência Aurora foi desvalidada várias vezes por esse pai. Quando percebia algum incomodo na escola ou no transporte público, seu pai desconsiderava suas queixas alegando que ela estivesse com preguiça e que não quisesse ir à escola, a convivência com esse pai até hoje é um pouco difícil.

Aos 13 anos Aurora finalmente obteve seu segundo laudo, onde foram observados sintomas compatíveis com o TEA, o que deu a família a dimensão das peculiaridades que Aurora sempre apresentou, deixando claro o quanto o tratamento e o apoio da família seriam fundamentais, deixando claro que o tempo de negação da família, tirou dela a possibilidade de ter iniciado um tratamento mais precocemente, o que a teria colaborado imensamente na sua evolução.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS


Aurora prefere usar o Girassol como símbolo de sua condição e causa particular ao invés de fazer uso do cordão de quebra-cabeça, símbolo usado pelos portadores do TEA, e justifica sua escolha alegando que o mesmo representa uma suposta complexidade do transtorno, “como se faltasse” uma peça em pessoas autistas e foi originalmente criado por uma organização repleta de polêmicas, por essa razão ela não se sente à vontade de usar essa identificação, defendendo a ideia de que para o autista não lhes faltam peças, mas sim oportunidades para se encaixarem na sociedade, e dessa forma, escolheu o girassol, que é o que ela mais gosta.

O girassol tem virado LEI em muitos municípios para representar deficiências ocultas, justamente por sugerir aquilo que inicialmente comentamos no início, felicidade, positividade, força, crescimento e confiança.

 

O TEA – Transtorno do Espectro Autista, autismo é um comprometimento neurológico   não uma doença. A maior das dificuldades do autista está localizada nas suas relações sociais.  O seu tempo e a forma de estar no mundo é singular, peculiar e idiossincrático.

Cabe a sociedade saber do que se trata e capacitar-se para acolher esses indivíduos como verdadeiros sujeitos de suas histórias com respeito e dignidade.


Autor: José de Ribamar Santos Souza- Aluno de formação em psicanálise.

Sob a supervisão e orientação da Prof. Mestre e Doutoranda em Psicanálise Andréa Pinheiro Bonfante.