Psicanalista Mestre e Doutoranda em Psicanálise

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

TRANSFERÊNCIA E APRENDIZAGEM, uma visão da psicanálise, por Andréa Pinheiro




TRANSFERÊNCIA E A APRENDIZAGEM
 A TRANSFERÊNCIA EM FREUD E LACAN


A presente matéria lança um olhar sobre as relações entre professores e alunos, num posicionamento não apenas horizontal, mas também vertical que se expressa pela hierarquia nessa relação, propondo pensar de que forma ela possa ser compreendida como uma transferência entre as partes e o quanto isso possa influenciar nos processos de aprendizagem que se estabelecem no ambiente escolar e deslizam pra vida desse sujeito transitando entre o simbólico, o imaginário e o real promovendo inclusive percepções e posicionamentos sobre suas dinâmicas de vida e ao longo dela.

Que lugar de mestre seria esse que a figura do professor ocupa de sujeito suposto saber (S-s-S), professor esse movido pelo desejo, numa função de tamanha relevância no qual gira o processo de aprendizagem e que em contrapartida possa vir a despertar no aluno um desejo de aprender, tão fundamental para que a aprendizagem ocorra, e que isso se estabeleça justamente na transferência entre as partes como um fenômeno originalmente espontâneo.

É relevante compreendermos e discutirmos sobre as relações, estabelecidas entre professores e alunos, inicialmente de forma espontânea segundo Freud. Elas nos darão notícias sobre como o processo de aprendizagem nas instituições escolares ocorra, entendendo que essa transferência fale de uma realidade ambígua entre o velho e o jovem, a distância e a proximidade, uma estranheza quanto a aceitarmos ordens sem que as contestássemos a princípio, independente de nossa idade, como se já não tivéssemos vivência suficiente para questionar essas ordens recebidas de nossos mestres.

Ao nos defrontarmos com esse cenário, deparamo-nos com as reminiscências de nossa vivência escolar pregressa dando-nos conta de que ela se manifesta no decurso de nossa vida, para o conhecimento humano e por conta dessa percepção, já que somos sujeitos identificados, constituídos e transformados por aspectos, traços, valores e atributos da cultura na qual estamos imersos, sublinhando as três categorias conceituais de Lacan: o simbólico, o imaginário e o real.

Esse registro do simbólico que é lugar fundamental da linguagem, fala da relação do sujeito com o grande Outro, que no sujeito envolve aspectos conscientes e inconscientes, o que significa que a maneira como esse inconsciente se manifesta se dá através da linguagem, e é por meio dela que os significantes (sistema de representações) nos dão notícias desse sujeito. O imaginário como registro psíquico corresponde ao eu do sujeito que busca no Outro (pessoas, amor, imagem, objeto) uma sensação de completude, dando-se conta de alguma forma que esse Outro não existe tal qual ele projeta ou deseja se vir projetado. Já o real é o impossível, aquilo que não se possa ser simbolizado, o indizível, aquilo que permanece impenetrável no sujeito. É um registro psíquico com o qual não se possa ser confundido no senso comum com a realidade.

O que nos foi ensinado e o quanto disso conseguimos aprender, passa a ser mais claramente sentido na aplicabilidade desses saberes em nossa vida adulta e profissional, e conseguimos perceber com razoável clareza a influência positiva que alguns mestres nos legaram motivando-nos, e porque não dizer influenciando-nos com determinadas tendências, posicionamentos e pontos de vista, enquanto que outros ao contrário, nos bloquearam em determinadas percepções que deslizam desde suas posturas até os conhecimentos dos quais eram detentores.

No processo de aprendizagem formal (instituições escolares), há algo de ambivalente no que se refere aos sentimentos do aprendente em relação ao ensinante, que remetem estes à relação primeira que tiveram com aqueles que lhes cuidaram, tais como pais, avós, babás, irmãos ou irmãs. Transferem para relacionamentos posteriores as imagos dessas relações. Atribuindo antipatias e simpatias às pessoas com as quais lidaram tal como uma herança emocional.
Dada a importância dessa relação de transferência precisamos também refletir sobre o lugar de mestre, de sujeito suposto saber que essa figura nomeada professor ocupa para seus alunos e que movido por esse desejo se ocupa de uma função na qual gira todo o processo de aprendizagem, e que possa despertar ou até mesmo interferir de forma negativa no desejo de aprender do aluno, desejo esse fundamental nesse processo.
O objetivo desse artigo é promover um questionamento acerca das razões as quais levem o aluno à aprendizagem ou à  não aprendizagem ou dificuldade dela e o quanto a transferência estabelecida entre as partes possa facilitar ou comprometer esse processo tanto desse lugar ao qual o aluno ocupa para o professor , assim como o lugar ao qual o professor se coloque ou que ocupe para esse aluno, na condição (S-S-S) sujeito suposto saber e /ou mestre.
Entender os motivos que levem os alunos a estabelecerem relações com as imagos de suas relações anteriores com a dos professores, que possam vir a comprometer esse processo de aquisição de conhecimentos e de vivências ao qual nomeamos aprendizagem.
Rinaldi cita Freud ao dizer que originalmente a transferência foi descoberta por ele como um fenômeno que acontece de forma espontânea, e que de acordo com a experiência psicanalítica, assume o lugar de conceito, conceito esse que Jacques Lacan vai sublinhar como o próprio conceito da prática psicanalítica, formulando a noção de sujeito suposto saber. Lacan ainda afirma no Seminário XI, que o conceito de transferência é determinado pela função que essa práxis ocupa e que “nenhuma práxis mais do que a análise, é orientada para aquilo que, no coração da experiência, é o núcleo do real” (LACAN-p.55)
 Essas duas afirmações permitem pensar a direção que dará à discussão da transferência, como mola mestra da análise, e à posição do psicanalista frente a esse instrumento, na condução de uma experiência analítica. A ênfase no real como o vetor que orienta esta práxis, nos chama a atenção para a importância que dará à noção de desejo do analista como função essencial em torno da qual gira o movimento da análise. Em suas palavras, “…o desejo é o eixo, o pivô, o cabo, o martelo, graças ao qual se aplica o elemento-força, a inércia, que há por trás do que se formula primeiro, no discurso do paciente, como demanda, isto é, a transferência.
O eixo, o ponto comum desse duplo machado, é o desejo do analista, que eu designo aqui como função essencial”(Ibidem, p.222)
Num contraponto entre a práxis psicanalítica e a práxis docente podemos considerar que assim como o desejo está como mola mestre da análise, o desejo também está para o processo de aprendizagem. A posição do mestre talvez possa ocupar um lugar tão relevante para o aprendente, assim como o lugar que o psicanalista ocupa para seu analisando. Entretanto, enquanto a análise dá ênfase ao real como o vetor que orienta essa práxis, a práxis docente em contrapartida, dá ênfase ao simbólico que é lugar fundamental da linguagem e ao imaginário que fala da relação do sujeito com o grande Outro, que neste caso é o professor.
Considerando entretanto que o desejo seja o pivô, a mola mestre que movimente essas duas práxis, podemos dizer que o desejo seja alimentado, nutrido, pela transferência em ambos. Se o que há por trás do discurso do paciente seja a demanda, também o possa ser para o aluno. Quando falamos desejo na práxis docente podemos pensar num movimento horizontal que desliza entre o docente e o discente. E não seria esse o ponto comum desse duplo machado? Um desejo, uma demanda, uma transferência que transita entre o analista e o analisando, entre o mestre e o aluno, e que em ambas as práxis ocupam um lugar de função essencial.
Autora:
Andréa Pinheiro Bonfante- Psicanalista e Psicopedagoga- Mestre e Doutoranda em Psicanálise, Docente do Instituto IBRAPCHS- RJ, Diretora e sócia do Espaço Vida Plena- Valença-RJ, Autora do livro "A Psicanálise e a Clínica do Autismo Infantil"

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

ROTULAÇÃO E MEDICALIZAÇÃO ABUSIVA DE NOSSAS CRIANÇAS

 




ROTULAÇÃO E MEDICALIZAÇÃO EXCESSIVA DE NOSSAS CRIANÇAS



“O disciplinamento médico na sociedade higienista passa pela fabricação de crianças, futuros homens rijos que, desde a mais tenra idade, devem ser acompanhados por médicos para que um dia estejam prontos para oferecer docilmente suas vidas ao país”*.

Há na sociedade contemporânea uma necessidade desastrosa em definir e rotular o que não se pode nem ser definido e tampouco rotulado, ou seja, a subjetividade de nossas crianças. Numa sociedade imediatista onde nada pode ser deixado para depois, não se pode perder tempo observando, esperando, permitindo ou ao menos deixando ser; acaba-se caindo num imenso engodo, que é a urgência de se definir agora, de não esperar, de não observar, de não se permitir e muito menos deixar ser.

Curioso observar que o que mais ouvimos da sociedade de uma forma geral é o quanto se preocupam com o futuro de nossa geração. Será mesmo? O que desejamos de fato para nossas crianças? Será que estamos comprometidos nessa missão de orientá-las e ampará-las ou apenas fingindo que nos importamos? Será que já paramos para ouvir o que de fato eles desejam ou os colocamos numa posição "assujeitada" aos nossos valores morais e financeiros? Fica aqui o questionamento.

Esse modelo nos remete à posição da criança da Época Medieval onde era vista como um adulto miniatura, sem ser ouvida, sendo desrespeitada na sua condição de sujeito, como sabiamente diz a psicóloga, psicanalista, mestre em pesquisa e clínica em psicanálise Terezinha Costa. Nessa época, a criança era vista como um pequeno adulto, sem características que o diferenciassem, e desconsiderada como alguém merecedor de cuidados especiais, relacionando-se muito mais com a comunidade do que com os próprios pais. E não é disso que se trata? Num discurso preso à uma urgência de prepará-los para o sucesso, acabamos por formar robores “zumbificados”, onde aquele que questiona, reclama, não aceita ou pensa fora do senso comum logo é rotulado de hiperativo, com transtornos, mal educado,  e tantas outras definições que possam vir a ser convenientes. E nesse caso, o que fazer? Que providência tomar? Medicar é lógico. SÓ QUE NÃO!. Não é disso que se trata, como diz nosso sábio Psicanalista Jacques Lacan.

“Hoje já podemos falar em aprendizagem sem necessariamente pensar num modelo único e puramente de transmissão de saber. Existem diversos modelos e uma vasta forma de trabalhar a educação, claro que umas que possibilitam mais autonomia e outras que ainda prendem o sujeito numa alienação, que o impede de ver o mundo com seus próprios olhos”. (JACQUES LACAN)¹

Há várias vertentes sobre essa questão, e o que também não podemos deixar de abordar é o quanto estamos comprometendo toda uma geração, impedindo-as de sonharem, de idealizarem, de se constituírem enquanto sujeitos. A situação é tão grave que inspirou a pediatra Maria Aparecida Affonso Moysés, professora titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, a fazer uma declaração bombástica: “A gente corre o risco de fazer um genocídio do futuro”, disse ela em entrevista ao Portal Unicamp. “Quem está sendo medicado são as crianças questionadoras, que não se submetem facilmente às regras, e aquelas que sonham, têm fantasias, utopias e que ‘viajam’. Com isso, o que está se abortando? São os questionamentos e as utopias. Só vivemos hoje num mundo diferente de mil  anos atrás porque muita gente questionou, sonhou e lutou por um mundo diferente e pelas utopias. Estamos dificultando, senão impedindo, a construção de futuros diferentes e mundos diferentes. E isso é terrível”, diz ela².

Charles José da Silva, Psicólogo Clínico, Psicanalista, Pós graduando em Teoria e Clínica Psicanalítica, comenta em um de seus textos Medicalização do Sofrimento e a Dor Existencial Humana “[…] medicalizaram-se as crianças, por apresentarem rebeldias que, até bem pouco tempo tratávamos como ‘coisas de crianças’ e que hoje demos o status de “doença”. Estamos tornando nossas crianças e suas infâncias doentes”³.

Posso constatar o que o caro colega comenta todos os dias em minha clínica, onde atendendo crianças com demandas das mais diversas ordens, sendo de aprendizagem ou emocionais, tanto na vertente Psicopedagógica ou Psicanalítica ,defrontando-me com familiares contaminados com o olhar do outro (escola, educadores, amigos, parentes, profissionais diversos) numa busca inalcançável de perfeição de conduta dessas crianças que desejam ser ouvidas e que na grande maioria das vezes os problemas que apresentam são da ordem do emocional. É preciso investigar a causa e não apenas voltar os olhares para os sintomas, afinal de contas é essa a proposta da prática psicopedagógica e psicanalítica, compreender que o sintoma fala da subjetividade do sujeito, e calar isto pode incorrer num grande equívoco. Precisamos aprender a exercitar um novo movimento "falar com as crianças" e não apenas "falar sobre elas".

Deixamos aqui um importante questionamento e propomos aos leitores uma importante reflexão.

* Artigo: Da higiene mental à higiene química: contribuições para um comportamento entre a criança tomada como objeto pelo higienismo e como sujeito de sua verdade pela psicanálise, 1989, página 179.
¹ http://filpsicanalise.blogspot.com.br/2010/08/jacques-lacan-e-educacao.html
² http://www.psicologiasdobrasil.com.br/ritalina-a-droga-legal-que-ameaca-o futuro/#ixzz456IeD8Xo
³ https://www.portalvalencarj.com.br/medicalizacao-do-sofrimento-e-a-dorexistencial-humana


 Andréa Pinheiro Bonfante- Psicanalista e Psicopedagoga - Mestre e Doutoranda em Psicanálise

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segunda-feira, 21 de setembro de 2020

A importância da confiança nos relacionamentos entre pais e filhos

 


Relacionamentos são como plantas – precisam de cuidados constantes; na medida certa; no tempo certo.

Muitas vezes alegamos não ter o tempo que gostaríamos para nos dedicar mais aos filhos.  A verdade é que o dia tem 24 horas para todo mundo.  Logo, precisamos encontrar a melhor forma de administrar essas 24 horas, de modo que haja tempo suficiente para os nossos compromissos.  O trabalho profissional, naturalmente, absorve a maior parte do dia de todos.  Sendo assim, outras ocupações, também muito importantes, deverão ter sua parcela de tempo definida da melhor forma possível, até por uma escala de prioridade.

E uma dessas ocupações é o nosso relacionamento com os filhos, de extrema importância.  E é sobre esse relacionamento que precisamos refletir, principalmente por ocasião do SETEMBRO AMARELO, dedicado ao tema SUICÍDIO. 

As estatísticas demonstram um crescimento alarmante no número de suicídios por parte de crianças e adolescentes, no correr dos últimos anos.  Os motivos são vários, incluindo bullying e a influência de redes sociais.

Gostaria de nesta reflexão abordar algo que devemos considerar como INDISPENSÁVEL em qualquer relacionamento, particularmente com os filhos – a CONFIANÇA.

Por mais reduzido que seja o tempo disponível para o relacionamento, quando há CONFIANÇA esse reduzido tempo acaba se tornando o necessário para que haja: escuta plenamente atenta; compreensão; companheirismo; troca de desabafos; empatia; orientação; etc.

Precisamos criar um clima com nossos filhos que deixe bem clara a real existência de uma presença constante, mesmo que nem sempre presencial, para que haja um diálogo proveitoso, que possa tratar de QUALQUER ASSUNTO, sem distinção.

E também é muito importante que esse clima de confiança permita que, se houver ALGO EXTREMAMENTE URGENTE, haja a certeza de que esse assunto será alvo de uma CONVERSA IMEDIATA, ou, caso impossível, no PRIMEIRO MOMENTO DISPONÍVEL.  E se essa última alternativa ocorrer, o filho/a filha saberá esperar, porque EXISTE UM CLIMA DE VERDADEIRA CONFIANÇA, que é o PRIMEIRO INGREDIENTE INDISPENSÁVEL para acalmar o íntimo daquela criança, ou daquela(e) jovem.

COMO CRIAR UM CLIMA DE CONFIANÇA NO RELACIONAMENTO?

Exemplos:

- olhe nos olhos, demonstrando total atenção;

- escute atentamente, dando claros sinais de interesse;

- deixe que o interlocutor se sinta à vontade para se expressar, da maneira como se sentir melhor;

- se necessário, para não ficar dúvida, faça alguma pergunta que possa esclarecer melhor a situação vivida, sem pressionar;

- sentindo-se suficientemente apto para ajudar, oriente, esclareça o que for necessário, indique caminhos, soluções;

- e o que é, também, muito importante: se os pais notarem que a situação vivenciada pelos filhos ultrapassa os seus recursos de ajuda, que um profissional qualificado seja procurado, para que uma análise mais adequada e eficaz possa acontecer.

- e, acima de tudo, deixe o(a) interlocutor(a) com a plena certeza de que pode continuar confiando nesse relacionamento – o melhor tipo de troca de ideias, de apoio de que ele(a) dispõe.


Nossos filhos necessitam de permanente acompanhamento, de observação.  Diante de qualquer mudança de comportamento, alteração na fisionomia, enfim, qualquer sinal de que algo os incomoda, precisamos agir rapidamente, embora sem pressioná-los.

Quando, de fato, existe um VERDADEIRO CLIMA DE CONFIANÇA, quando os filhos passam a vivenciar situações de dúvida ou de perigo, os pais são imediatamente procurados.


Paulo de Aquino-Educador

terça-feira, 7 de julho de 2020

Um olhar sobre o currículo inclusivo para além dos aspectos burocráticos



Um olhar sobre o currículo inclusivo para além dos aspectos burocráticos











Jardel Delgado Marques
Administrador de empresas, pós-graduado em Docência no Ensino Superior e Psicomotricidade, licenciando em Pedagogia (UNIRIO/Cederj/Cecierj), especialista em Temas e Perspectivas Contemporâneas de Educação e Ensino (Cefet/RJ - câmpus Valença), monitor de Inclusão na rede pública de Valença/RJ


A Educação Inclusiva como modalidade de ensino que perpassa todas as fases de ensino, desde a Educação Infantil até ao Ensino Superior, tem sido objeto de estudo e tema de muitas pesquisas acadêmicas atuais, como as que servem de material de pesquisa para leitura e análise do presente artigo, uma vez que é sabido que seria contraditório conhecer as postulações e defesas de tal modalidade e não fazê-las estar inseridas na prática educativa atual.

Falar sobre o atendimento aos alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação é, na atualidade, sair em defesa dos direitos de uma minoria desprovida de voz e vez e que vem despertando o interesse de muitos pesquisadores da área educacional. Muitos movimentos se colocaram como forma de orientação para que o processo de escolarização desses alunos fosse garantido, como: Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e Associação Laramara, dentre outros.
Contudo, a inclusão ainda é uma realidade irresoluta, dado o despreparo dos docentes que recebem tais alunos e alunas em suas salas de aula. Além disso, muitas vezes o currículo é construído de forma teorizada, com o fim de cumprir metas e diretrizes que priorizem apenas o conteúdo em sua forma mais orgânica.
Nos últimos anos, muitos educadores de escolas públicas brasileiras têm se surpreendido com a presença de alunos com deficiências matriculados em suas turmas, em diferentes níveis de ensino. Essa situação é resultante de uma política denominada Educação Inclusiva, que tem sido implantada explicitamente desde 2003 (Kassar, 2011, p. 62).
Assim como afirma Kassar (2011), a inclusão escolar tem sido um processo atual nos cotidianos escolares. Dessa forma, é importante discutir o acolhimento desses alunos, além de levar em consideração a definição que muitos autores assumem quanto à inclusão escolar.

O presente artigo, munido de tais pensamentos e sustentados em pesquisas atuais como as de Izabella Sant’Ana, Márcia Denise Pletsch, Mônica de Carvalho Magalhães Kassar e Rosana Glat, visa promover uma reflexão tomando como ponto de partida o currículo escolar e como deve ser guiado o trabalho de inclusão escolar.
São apresentados ainda exemplos de garantias legais que asseguram a Educação Inclusiva, como a Constituição Federal (1988), a Lei de Diretrizes Bases da Educação (LBDEN, nº 9.394/96), a Declaração de Salamanca (1994), a Resolução nº 2, de 11 de setembro de 2001 e o Decreto nº 6.949/09, dentre outras deliberações que serão citadas nesse trabalho.
Assim, é apresentada uma revisão literária sobre o tema com base em pesquisas acadêmicas atuais e estudiosos que tornam a discussão desse assunto algo relevante e fundamental para a promoção do respeito à diversidade humana no contexto escolar, uma vez que apenas com conhecimento embasado será possível promover a inclusão escolar.

A inclusão escolar das pessoas com deficiência

Atualmente, o termo diferença tem ganhado força, sobretudo no cenário educacional, pois o respeito e a convivência com as diferenças têm sido estimulados como um esforço de oferecer uma formação mais humana e consistente. Mas o atendimento ao deficiente sempre foi priorizado pelo nosso sistema educacional? Quando a temática da inclusão ganhou força?
Esses e outros questionamentos formam o escopo desta pesquisa, que ainda prevê uma pesquisa de campo com entrevistas com os envolvidos na Educação Inclusiva na cidade de Valença/RJ, a fim de reforçar e ilustrar a aplicabilidade do tema aqui estudado, além de oferecer suporte teórico para guiar o trabalho dos educadores que acolhem tais alunos com deficiência, pois a inclusão tornou-se importante tema para ser levado para dentro da sala de aula e serem promovidos debates fundamentados nele.

A Educação Inclusiva no Brasil: ontem e hoje

Cabe neste momento inicial abrir a explanação do tema em questão, fundamentando e situando a trajetória histórica e social da Educação Inclusiva em nosso país; a história desse tema possui raízes que nos permitem reconhecer e valorizar o atual momento.    
Podemos, pois, afirmar que a história da educação de pessoas com deficiência no Brasil está dividida entre três grandes períodos:
· de 1854 a 1956 - marcado por iniciativas de caráter privado;
· de 1957 a 1993 – definido por ações oficiais de âmbito nacional;
· desde 1993 – caracterizado pelos movimentos em favor da inclusão escolar (Mantoan, 2006, p. 33).
Assim como apresenta Mantoan (2006), o atendimento de pessoas deficientes chegou ao Brasil no século XIX, quando algumas pessoas, inspiradas em ideias europeias e norte-americanas, dedicaram-se a implementar ações isoladas e particulares para atender a pessoas com deficiências físicas, mentais e sensoriais. Era a inauguração de um pensamento que considerava que as pessoas com deficiência poderiam se desenvolver e serem inseridas na sociedade. Desse modo, é possível afirmar que o atendimento ao deficiente é algo recente aqui no Brasil, datando de 2006, apesar de leis que postulam o contrário e que serão exemplificadas adiante.
Todavia, o acolhimento e o atendimento de pessoas deficientes nem sempre foi garantido em nosso país. O ato de incluir alunos com alguma deficiência, por mais simples ou severa que seja, foi, e ainda é, uma luta constante de pais, professores e outros profissionais empenhados nessa causa tão nobre. Ainda está enraizada na práxis educativa a simples questão da integração de pessoas deficientes, isto é, de apenas acolher o deficiente no contexto, mas não se preparar para essa acolhida.
Mantoan (2006, p. 121) defende que “a escola inclusiva propõe um sistema educacional que considera as necessidades de todos os alunos, estruturado em função dessas necessidades”. Assim, a escola, com todas as suas práticas e seu dinamismo, se molda para melhor acolher os seus alunos e alunas.
Como afirmam Glat, Pletsch e Souza (2007), a proposta de uma escola inclusiva ganhou destaque quando da publicação da Declaração de Salamanca; em 1994, foi firmada a função da unidade escolar de receber matrículas de alunos com alguma deficiência. No documento, diz-se que o aluno teria garantido seu direito de estar presente e ter adaptações em seu currículo.
Se todos têm direito à educação, por que o segregar torna-se comum? Tal pergunta nos faz repensar inclusive nosso sistema educacional, com tantas falhas e ainda com uma práxis educativa que, por vezes, valoriza o saber erudito como única forma de inserção na sociedade contemporânea, em detrimento de uma inclusão que seja dinâmica e funcional como forma de inserção social.

Com isso, cabe afirmar que ainda que ocorrem movimentos em oposição à inclusão escolar de alunos portadores de deficiência; percebe-se que os mecanismos legais e mundiais, no que concerne à educação, depõem em favor de que a inclusão seja muito mais do que uma mera tendência, mas que se torne uma nova face do sistema educacional. Acolher alunos especiais é, hoje em dia, uma função da escola que deve ser estimulada cada vez mais e amparada pelas políticas públicas. Como registra a Secretaria de Educação Especial do MEC, “inclusão não significa, simplesmente, matricular os educandos com necessidades especiais na classe comum, ignorando suas necessidades específicas, mas significa dar ao professor e à escola o suporte necessário à sua ação pedagógica” (Brasil, 1994, p. 18).
O ditame da Secretaria confirma que o atendimento educacional no Brasil deve oferecer a plena inserção desse sujeito no contexto escolar, dando preparação devida ao professor e oportunidades equitativas para que esse aluno possa se desenvolver, frente a suas necessidades e seus desafios.
Portanto, a teoria institucionalizada pelas leis e outros mecanismos legais garante que os alunos possam ser incluídos no ambiente escolar, contribuindo, dessa forma, para a promoção de uma sociedade justa e equitativa, na qual diferenças não sejam vistas como obstáculos, mas como formas de melhoria no desenvolvimento do caráter e de um olhar mais humano e colaborativo.
Pensar em Educação Inclusiva é pensar na real possibilidade de incluir o aluno nas realidades do contexto escolar. Cabe ressaltar que, no atual momento, o sistema educacional vive seus percalços e contradições, com corte de verbas e dificuldades orgânicas e sociais. Entretanto, faz-se necessário conhecer a fundo as verdadeiras capacidades que cada aluno apresenta e, munido de tais conhecimentos, pensar num currículo que prime por desenvolver tais habilidades e competências.
Como afirma Mader (1997, p. 17), “inclusão é o termo que se encontrou para definir uma sociedade que considera todos os seus membros cidadãos legítimos”. Dessa forma, o ato de incluir transcorre do fato de levar em consideração a cidadania de cada indivíduo e, acima de tudo, a sua dignidade humana.
Ainda assim, o currículo escolar deve ser revisto para cada aluno que é acolhido na unidade escolar. Não é aconselhável que se pense e elabore um currículo único para a modalidade de Educação Inclusiva ou ainda que os alunos tenham seus conteúdos moldados conforme aquilo que é próprio de cada série escolar. É viável que o aluno seja acolhido, incluído no contexto e não que ele tenha, com todas as suas já dificuldades de integração, se adaptar àquilo que está sendo proposto.
A Educação Especial, em todo o mundo, a partir da integração, teve que ser reestruturada. Apesar da criação de sala com recursos para atender o aluno com necessidades especiais, ele continuava sendo considerado especial e tendo atendimento segregado. O conceito de integração começou, então, a ser revisto, por ser considerado ultrapassado e a escola inclusiva foi, gradativamente, implementada em vários países (...) e o movimento se fez na direção da inclusão total (Glat, 1998, p. 35).
Glat (1998) assevera que o termo de atendimento ao aluno portador de deficiência também sofreu algumas alterações ao longo do tempo, passando de integração para inclusão. A mudança de terminologia já indica grande preocupação em tornar esse atendimento ainda mais eficaz e que considere a verdade de cada aluno. Incluir não é um ato de tornar normal o aluno deficiente, esse ato é ainda mais humano quando, na escola, aprendemos com a diversidade. Paulo Freire (1980) aponta que é mais fácil aprender com as diferenças do que com as igualdades.
Uma proposta curricular destinada aos alunos com deficiência considera aquilo que ele será capaz de desenvolver com autonomia e responsabilidade, de modo a integrar-se ao contexto da sala de aula e fora dos muros da escola. Os conteúdos lecionados deverão ser mentalmente desafiadores e tangíveis ao seu cognitivo, de forma a oportunizar que ele encontre significado naquilo que aprende e que possa utilizar no seu meio social.
Como exemplo para o que foi citado, mencionamos um conteúdo matemático, próprio de uma proposta curricular de 6º ano: “operações com frações”. Um aluno que se encontra acolhido nessa turma assistirá às aulas e às explicações com o referido conteúdo. Todavia, ele não encontrará uma lógica significante para a aplicabilidade desse conteúdo, levando em conta que apresenta ainda muitas dificuldades em realizar operações com números naturais e na leitura e interpretação de palavras com baixa complexidade ortográfica.
Dessa forma, pensar que o aluno deverá receber o mesmo conteúdo da turma sem que haja uma preparação prévia é não incluir. O professor poderá pensar numa metodologia de apresentar o conteúdo a todos, mas elaborar atividades diferenciadas e que sejam ricas e significantes ao aluno e que envolvam seus colegas de classe, atividades que sejam mais concretas e reais ao contexto.
Como postula Sant’Ana (2005, p. 228), “a orientação inclusiva implica um ensino adaptado às diferenças e às necessidades individuais”. Com isso, não deve ser o aluno a se adaptar à escola, mas esta é que deve prover meios e estimular a formação docente frente aos novos desafios e especificidades discentes. A simples guarda de documentos não efetiva a inclusão em si.
É importante mencionar que a adaptação curricular acontece nas realidades das escolas regulares que matriculam alunos com alguma deficiência, porém essa adequação atenta apenas aos mecanismos burocráticos, preocupados apenas com o arquivamento de provas documentais. Em resumo, na guarda de papéis que comprovem que a “inclusão” ocorreu. Logo, a prática e a teoria não se fundem nesse contexto.
Como aponta Mantoan (2006, p. 12), “uma modalidade de ensino única reduz as chances de se encaminhar os problemas e as dificuldades para ensinar algumas crianças, com ou sem deficiências”. Assim, é de vital importância que os educadores estejam conscientes do seu papel de despertar no aluno o desejo de descobrir a partir da elaboração de tópicos motivadores e com relevância para a vida prática, tanto para os alunos ditos normais como para os alunos com deficiência; isso tornará o aprendizado muito mais rico e significativo.

A Educação Inclusiva e suas diretrizes

A luta das pessoas com deficiência para se manter inseridas na sociedade encontra-se fundamentada nas leis e políticas públicas. A legislação é um dos meios mais eficazes para garantir que a inclusão aconteça, além de combater a discriminação e o desrespeito. Todavia, apesar da garantia legal, essas pessoas ainda travam verdadeiras batalhas a fim de se colocar em meio a um país com desigualdades sociais tão notáveis. Jannuzzi (1993, p. 15) aponta que “nos países desenvolvidos a lei é baixada para consagrar o costume. Aqui se tem a pretensão de gerar mudanças de costumes através da imposição de leis”.
É notável que o Brasil sofra grandes e significativas mudanças em conceder o direito das pessoas deficientes, fruto de movimentos internacionais como a Declaração de Salamanca (1994), a Convenção de Guatemala (1999) e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de Nova York (2007). Tais movimentos internacionais produziram frutos positivos no cenário socioeducativo do Brasil.
Com esses movimentos, que tiveram a Educação Inclusiva como tônica, os educadores preocupados com a inclusão escolar pressionaram o poder público a fim de que o Brasil fosse signatário de leis e diretrizes que considerassem a temática como uma nova vertente do contexto escolar.
Tomando como ponto de partida a Constituição Federal de 1988, são promulgados nos Arts. 23 e 208 os seguintes escopos:
Art. 23 - É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...)
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência; (...)
Art. 208 - O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: (...)
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino (Brasil, 1988).
Dessa forma, já se nota a responsabilidade do governo em promover efetivamente cuidados educacionais às pessoas portadoras de deficiência. Porém, para que seja reforçada essa relevância e garantia de direitos, em 2001 foi divulgada a Resolução nº 2, que institui as diretrizes para a Educação Inclusiva na Educação Básica. Dela podem ser extraídos os seguintes trechos:
Art. 2º - Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos. (...)
Art. 8º - As escolas da rede regular de ensino devem prever e prover na organização de suas classes comuns: (...)
III - flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significado prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos didáticos diferenciados e processos de avaliação adequados ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância com o projeto pedagógico da escola, respeitada a frequência obrigatória (Brasil, 2001).
Desse modo, assim como é apresentado nos dois dispositivos legais, a Educação Inclusiva encontra-se amparada, tendo em vista o que é ditado na Constituição Federal e na Resolução do Conselho Nacional de Educação (2001), quando é afirmado o comprometimento com a Educação e com o atendimento educacional especializado, considerando uma flexibilização curricular que propicie uma metodologia crítica e funcional ao aluno, isto é, que o currículo e toda a metodologia sejam adaptados à realidade e ao contexto cognitivo de cada aluno acolhido.

Pode-se ainda elucidar o que até aqui se disse com o Decreto nº 6.949/09, oriundo da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ocorrida na cidade de Nova York em 2007, quando foi redigido:
Art. 24 - Da Educação
1. Os Estados partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à educação. Para efetivar esse direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os Estados partes assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida, com os seguintes objetivos: (...)
b) O máximo desenvolvimento possível da personalidade e dos talentos e da criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas habilidades físicas e intelectuais;
2. Para a realização desse direito, os Estados Partes assegurarão que: (...)
c) Adaptações razoáveis de acordo com as necessidades individuais sejam providenciadas;
d) As pessoas com deficiência recebam o apoio necessário, no âmbito do sistema educacional geral, com vistas a facilitar sua efetiva educação
(Brasil, 2009).
Com essa medida, o poder público torna-se ainda mais responsável para que garantias de inserção social e diminuição da desigualdade sejam realizadas em âmbito nacional, pelo meio educacional justo e de qualidade.
Muitos outros exemplos de legislação que têm a Educação Inclusiva por objeto poderiam ser exemplificadas aqui; entretanto, o trabalho ficaria muito extenso e redundante, pois apenas com estas exemplificações já se pode cumprir o objetivo de trazer à luz do conhecimento que o atendimento ao deficiente não é um favor feito pelo sistema educacional, tampouco deve ser uma obrigação. Esse atendimento deve ser humanizado, pautando-se nas legislações vigentes e na função social que a escola representa na contemporaneidade. Afinal, as leis tornam-se a base para que ocorram a acolhida e o atendimento do aluno com deficiência ou transtornos globais de desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação.
Sendo assim, as leis garantem, no papel, que a matrícula de um aluno portador de deficiência seja realizada em uma escola regular. Porém cabe ao poder público, em parceria com as secretarias municipais de Educação e os educadores envolvidos na causa, defender a efetividade dessa modalidade de ensino e a promoção de um currículo que seja adaptado às necessidades do aluno, e não um currículo em que o aluno precise ser moldado para alcançá-lo.
Consequentemente, a inclusão escolar garante, acima de tudo, a celebração das diferenças, sendo um tema que vem ganhando força nas pesquisas escolares e que não se esgota. A cidadania e o trabalho cooperativo são marcas decisivas para a realização do ato de permitir o acesso aos inúmeros ambientes sociais, principalmente o escolar. Pensar apenas nos documentos escolares que devem ser preenchidos quando ocorre uma adaptação curricular é pensar numa inclusão de caráter burocrático e com aspecto negativo, indo contra o que é a inclusão escolar verdadeiramente.

Considerações finais

A presente pesquisa apresenta uma revisão bibliográfica buscando relacionar temas do cotidiano com assuntos de cunho histórico-social e com as legislações que abordam a Educação Inclusiva em âmbito nacional.
Entretanto, mesmo em andamento, a pesquisa já esboça um caminho desafiador: rever o currículo escolar a fim de adequá-lo à real necessidade social de cada aluno matriculado. A escola, para garantir os direitos de seus alunos incluídos, deve promover adequação contínua de seus métodos didáticos.
Nesse contexto, o atendimento ao aluno deficiente deve ter como meta oferecer um olhar mais humanizado e considerando as reais capacidades do aluno. Sob essa perspectiva, a formação docente torna-se elemento fundamental no alcance de tal meta, pois o conhecimento é uma poderosa ferramenta de luta e transformação social.
É sabido que as adaptações curriculares e outros documentos relativos à inclusão de alunos deficientes visam apenas cumprir obrigações de ordem burocrática, e isso dificulta e impede a real inclusão, uma vez que muitos professores encaram a inclusão como tarefa extra, como mera função burocrática. É preciso desconstruir tal pensamento a fim de que a inclusão escolar seja efetivada.
Portanto, salienta-se que os educadores e todo o corpo administrativo escolar, ao acolher um aluno portador de deficiência, poderiam levar em consideração repensar sua práxis e seu ambiente físico de acolhimento, de modo a incluir realmente o aluno dentro da política e da dinâmica da unidade escolar. Assim, estará sendo promovido um serviço educacional íntegro e afetivo, além do respeito aos direitos da pessoa deficiente.
Desse modo, o caminho a ser apontado como solução para tais dilemas vividos no chão da escola reside na formação docente adequada, em que a inclusão não seja vista como forma burocrática para endossar as legislações vigentes no Brasil, mas sim como forma de contribuir para o senso de cidadania dado aos alunos, apregoando um caráter mais rico e humano. Com isso, a escola assume o seu verdadeiro papel social de estar afetando a sociedade de forma positiva e promovendo o respeito à diferença.

Referências

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BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 19 out. 2019.
______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Politica Nacional de Educação Especial. Brasília: SEESP, 1994.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). Brasília, 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em: 19 out. 2019.
______. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução nº 2, de 11 de setembro de 2001. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Brasília, 2001. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CEB0201.pdf. Acesso em: 19 out. 2019.
______. Decreto nº 6.949/09. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York em 30 de março de 2007. Brasília, 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm. Acesso em: 19 out. 2019.
DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf. Acesso em: 19 out. 2019.
FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. 5ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
GLAT, R. Capacitação de professores: pré-requisito para uma escola aberta à diversidade. CONGRESSO IBERO-AMERICANO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. 1998, Foz do Iguaçu. Anais... Brasilia: Qualidade, 1998.
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MADER, G. Integração da pessoa portadora de deficiência: a vivência de um novo paradigma. São Paulo: Memnon, 1997.
MANTOAN, M. T. E. (Org.). A Educação Especial no Brasil – da exclusão à inclusão escolar. São Paulo: Memnon, 2006.
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SANT’ANA, I. Educação Inclusiva: concepções de professores e diretores. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 10, nº 2, p. 227-234, maio/ago. 2005.
Publicado em 09 de junho de 2020

LIBRAS- Inclusão à comunidade surda



LIBRAS- Inclusão à comunidade surda





A psicóloga e especialista em libras Carolline Lopes, nos convoca a pensar acerca da inclusão e nas dificuldades de linguagem que um surdo enfrenta na sua rotina, e para elucidar essa questão, traz essa bela história, escrita por ela.


Texto:

Vamos imaginar agora que estamos em um ponto de ônibus depois de um dia de trabalho. Um cadeirante se aproxima, começamos a conversar sobre o tempo ou o último episódio da novela.Logo após, um cego e uma pessoa com síndrome de Down se aproximam e continuamos nosso diálogo.Mais tarde se aproxima outra pessoa, mas agora essa pessoa tem uma surdez profunda e é usuário da Língua de sinais, o que fazemos?

Muitas vezes uma simples conversa, corriqueira, fica difícil por não conhecermos a realidade daquela pessoa, não é verdade?A inclusão propõe um mundo mais igual para todos, é olhar as pessoas pela capacidades e não pela falta. Esse é um desafio para as escolas hoje. Os professores e pais são os principais agentes que promovem a inclusão.Ao pensar na deficiência auditiva, esse processo tem suas peculiaridades. Entender a sua realidade é essencial para essa finalidade.

A perda auditiva é dividida em vários graus e níveis, temos a perda leve, moderada, profunda e severa. A partir de então, cria-se uma infinidade de tipos( de formas) de se lidar com a deficiência auditiva a depender do grau e da pessoa. Ou seja,há pessoas que tem perdas moderadas a leve que apenas utilizam o aparelho auditivo ou a leitura labial para se comunicar. No grupo dos deficientes auditivos temos 3 sub-divisões, aqueles que usam a libras, aquele que usa a leitura labial e aquele que utiliza das duas formas de comunicação. 



Aqui trago para vocês sobre os surdos que utilizam a Língua Brasileira de Sinais. Cada um dos integrantes dos grupos que falei anteriormente precisam de uma atenção quando o assunto é inclusão, por isso optamos em falar primeiramente desse grupo.

Gostaria de explicar sobre o uso da palavra surdo, como dito anteriormente a deficiência auditiva abrange uma infinidade de pessoas, dessa forma ao falar apenas deficiente auditivo muitas vezes não abraçamos a realidade tão própria dos usuários da Língua de sinais, dessa maneira utilizamos o termo Surdo para designar a essa população específica. 

A audição tem papel primordial na nossa aquisição de conhecimentos. Ela é o meio que utilizamos para nos comunicar, aprender novas coisas e ter um contato com o mundo. Esse é principal ponto para entendermos a perda auditiva profunda nas crianças, como propõe esse texto.

O fato de não possuir capacidade auditiva ou ter baixa capacidade, muda completamente sua forma de compreensão de mundo. Por exemplo, se perguntarmos para uma criança pequena como o cachorrinho faz, a criança ouvinte responderá: Au! Au! Já a criança surda irá falar que abana o rabo. Percebe a diferença? A percepção do surdo está muito mais ligada a fatores visuais do que qualquer outro ponto. E isso se reflete em toda nossa vida. A Língua de Sinais foi criada observando esse ponto.

Por exemplo, a pedagogia visual estuda como transformar um conteúdo em imagem e é um forte aliado de professores na criação de seus conteúdos didáticos.   

Outro fato marcante, que já iniciei a falar, é o idioma. A primeira Língua do Surdo, em sua grande maioria, é a LIBRAS e não como nós, a língua portuguesa. Se você pensar em : Eu quero um copo d’agua! Provavelmente pensara nessa frase em português em sua cabeça. Muitas vezes a pessoa com surdez pensa nas imagens ou essa frase em Libras. A língua é a forma que ele pensa, se comunica e compreende o mundo. Nos coloquemos no lugar deles, imagine entrando em uma sala onde o idioma falado é um que você não sabe ou sabe pouco. Será difícil entender com perfeição toda a matéria abordada, não é mesmo? Essa é a forma que o Surdo muitas vezes entra em nas salas.
   

A forma de compreender o mundo produz o que chamamos de Cultura Surda, que é em muitos pontos diferente da nossa. Isso deve ser pensado pelos agentes que promovem a inclusão. 
Ao receber uma criança com surdez é primordial descobrir o seu mundo, sua maneira de enxergar as coisas ao redor. Cada criança é única, um grande mistério para nós, na qual a ajudaremos a se desenvolver. Se permita a se aventurar no mundo da Libras e de uma nova forma de olhar.

Carolline Lopes- Psicóloga e Especialista em Libras - CRP: 05/50327

terça-feira, 23 de junho de 2020

COLÔNIA JULIANO MOREIRA- OS HORRORES DA PSICOSE



COLÔNIA JULIANO MOREIRA- OS HORRORES DA PSICOSE

ANOS 80



Colônia Juliano Moreira- Anos 80

A Colônia Juliano Moreira situada em Jacarepaguá- RJ com mais de 7.000.000 de Km quadrados, 749 funcionários estando 706 na administração e apenas 43 no trato direto com os pacientes, contava com apenas 20 médicos no ano de 1980 para cuidar de quase 5.000 internos. Foi quando pela primeira vez uma emissora de televisão teve o consentimento de entrar na instituição e oportunizar aos telespectadores a real dimensão do tratamento psiquiátrico da época.
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Ainda nesta década, no ano de 1988, houve então uma intervenção militar na Colônia Juliano Moreira onde esteve presente o Assistente do Ministério da Saúde Dr. Ricardo Aragão, que em entrevista à imprensa, justificou a presença da força policial como proteção à autoridade que adentrava a instituição, o Secretário de Programas Especiais de Saúde o Sr. Celso Hilguert responsável pela interdição, que foi recebido sob protesto numa manifestação pacífica pelos funcionários da instituição que acreditavam que essa demonstração de poder contra a gestão do Dr. Clécio, representava na verdade um retrocesso no tratamento dos pacientes que voltariam a ser tratados como mercadoria, inclusive  a volta do eletrochoque, cárceres privados e até mesmo da lobotomia, tão utilizada no caso de pacientes ditos como graves na década de 60.
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A Colônia Juliano Moreira foi criada em 1924, dentro dos mais modernos conceitos psiquiátricos da época, por Francisco da Rocha e Teixeira Brandão, que acreditavam e defendiam uma cultura higienista (pensamento europeu que tinha como objetivo afastar da sociedade o indivíduo que não se enquadrava nos ditos “padrões normais”, que iam desde crianças com comportamentos indesejados à prostitutas, negros, moradores de rua, homossexuais, dentre outras motivações mais incoerentes possíveis. Estima-se que apenas 30% dos internos apresentavam comportamentos psiquiátricos que justificassem suas permanências ali.




O hospital psiquiátrico Juliano Moreira recebia diariamente um número expressivo de pacientes com históricos de várias internações, pacientes esses que possuíam a chance mínima de retorno e reinserção ao convívio social, pois além de não haver por parte da família um interesse de reintegrar esse indivíduo ao seu núcleo familiar, por outro lado, não havia interesse da instituição em dar alta para esses pacientes que representavam grande lucro para os cofres da direção da colônia.
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Em todos os hospícios brasileiros da época, ao termo mais usado em relatórios era “super lotação”. Assim como em outras instituições psiquiátricas, na Colônia Juliano Moreira, pacientes eram amontoados em celas sem nenhuma condição de higiene, dormindo no chão, submetidos a eletrochoques de forma completamente arbitrária.
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Durante 10 anos, entre 1966 e 1977, a Colônia recebia crianças e jovens da FUNABEM, cuja grande maioria não apresentava nenhum laudo ou laudos nada plausíveis e confiáveis, que justificassem a arbitrariedade da condição absurda e revoltante as quais as vidas dessas crianças e jovens eram tomadas de forma tão violenta e irreversível tendo de conviver num ambiente tão hostil  entre adultos sendo-lhes sequestrado o direito de terem sequer suas infâncias preservadas.



No final da década de 60, em 1967, o hospital já era considerado o mais populosos dentre os hospitais psiquiátricos do Brasil, com quase 5.000 internos. Dentre esses internos, 1223 dormiam no chão amontoados uns sobre os outros numa condição sub-humana de total desamparo. Em 1974 começa então a diminuir o número de internações e diversos pacientes serem transferidos para clínicas particulares conveniadas ao INPS, política essa que favoreceu a expansão do setor privado e declínio da assistência pública de saúde. 
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Data do início da década de 80, devido a redemocratização do país, a primeira entrada da imprensa no interior da Colônia, possibilitando então mostrar ao público, a triste realidade dos pacientes que ali foram despejados, esquecidos e negada sua condição humana, causando assim espanto e perplexidade.
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O público pode então verificar os maus tratos e abandono aos quais os cidadãos, seres humanos como nós, estavam sendo submetidos, simplesmente como caráter punitivo e não como forma de tratamento.
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A partir de então passa a existir uma cogestão entre o Ministério da Saúde e o INAMPS, que cria uma política de reintegração social dos pacientes- O Projeto de Etapas- que consistia no pagamento de bolsas aos serviços que os internos prestavam lá dentro, numa tentativa  de “indenizar” esses pacientes que durante tanto tempo foram abandonados à própria sorte, despertando nos internos uma grande esperança de retomada de vida e resgate de suas subjetividades. A instituição progride para as eleições diretas na escolha do diretor da Colônia- Dr. Clécio Maria Gouvêa- que conquistou a confiança dos funcionários pelo trabalho realizado.
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Ao falarmos da Colônia Juliano Moreira não podemos deixar de mencionar um de seu mais célebre interno, o “Bispo do Rosário” cujas obras de arte tem sido reconhecidas dentro e fora do país. Mais três artistas contemporâneos tiveram suas obras expostas no Museu de Belas Artes; Gilmar Ferreira, Leonardo Lobão e Patrícia, e que hoje são monitores da oficina de pintura do Museu Bispo do Rosário.
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Ernesto Nazareth, um dos internos, compôs mais de 200 músicas e faleceu na Colônia aos 73 anos. Suas músicas inclusive foram as únicas usadas neste  documentário, nosso objeto de estudo- “Colônia Anos 80”. https://www.youtube.com/watch?v=lfthcmFmv6E 
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Grandes artistas, pintores, pintoras, poetas e poetisas, também estiveram internados por lá grande parte de suas vidas ou até mesmo nunca saíram, falecidos na instituição sob o olhar do abandono sem nunca terem sido lembrados por seus familiares.
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Depois da intervenção de 1988, sob a indignação de muitos, intensa negociação e um abaixo assinado de vários deputados federais, o Dr. Clécio então diretor, reassume e termina seu mandato. Em 1992 em novas eleições diretas, Dr. Laerte Thomé é eleito o novo diretor, mas devido à inúmeras denúncias de irregularidades, dentre elas venda de terras, abalam a tranquilidade da instituição provocando seu afastamento. Entretanto em 1995, é reeleito e os funcionários fundam na mesma época um jornal intitulado ”O Parabólico”, desempenhando papel primordial na informação dos funcionários.



Em 1996, os escândalos de irregularidade e descaso com os tratos dos internos, afastam definitivamente o então diretor, passando a colônia a ser municipalizada com o novo nome de “Instituto Municipal de Assistência à Saúde Juliano Moreira”
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Em 1993 chega finalmente a proposta de criação de Lares de Acolhimento e de residências Terapêuticas na comunidade, numa tentativa de resgatar a humanidade dos internos, que através de relatos e testemunhos obteve sucesso podendo oferecer a eles o mínimo de dignidade e humanização.
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Como podemos observar, a história da Colônia Juliano Moreira é a prova cabal de uma sociedade higienista que preferiu ignorar seus doentes e submeter os diferentes a uma covarde condição de desamparo e desumanidade que durante muitos anos a sociedade preferiu ignorar.
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Entretanto façamos uma reflexão sobre o que ainda fazemos com nossos doentes psiquiátricos e com os que dentro de uma sociedade hipócrita e um preconceito velado são rejeitados e postos de lado, pelo simples fato de serem diferentes, não piores, apenas diferentes.


Andréa Pinheiro Bonfante- Psicanalista. Mestre e Doutoranda em Psicanálise, Saúde e Sociedade

sexta-feira, 5 de junho de 2020

ALTAS HABILIDADES E SUPERDOTAÇÃO

ALTAS HABILIDADES E SUPERDOTAÇÃO 




O que fazer diante de uma criança com altas habilidades e/ou superdotação? Familiares, professores e instituições escolares se veem diante de um impasse. Tratá-lo como um pequeno gênio ou uma criança com habilidades diferenciadas? Quem é essa criança que aprende num ritmo diferente do que a maioria dos outros do seu grupo?
As perguntas e as dúvidas são muitas, mesmo porque pouco se fala sobre isso, até o momento em que elas batem a nossa porta. A família chega trazendo relatos de episódios muitos curiosos sobre o que vem acontecendo na escola e no grupo social do qual fazem parte, que muitas das vezes causam desconforto e estranheza.
Essa criança que aprende a ler com muita facilidade, que sabe contar além dos números que a maioria dos da sua idade conseguem, que tem muita curiosidade em saber coisas novas,  que nem sempre consegue ficar quieto em sala de aula porque já conseguiu fazer as atividades antes dos coleguinhas, que se sente entediado e muitas vezes desmotivado em ir pra escola porque “já sabe tudo”, precisa ser ouvida com muita atenção, e não ser encarada como uma “criança problemática”. Ela é especial tanto quanto uma criança que tenha dificuldades de aprendizagem porque tem necessidades e demandas diferentes das outras, e precisa de atendimento individualizado e direcionado.
A família precisa ser orientada, não apenas pra saber quais são os direitos dessa criança, mas também pra saber lidar com suas altas habilidades. A escola também pode precisar de orientações do profissional que o acompanha, para que o processo de adequação transcorra com facilidade e tranquilidade Esses profissionais geralmente são o Psicopedagogo ou Neuropsicopedagogo e o Neuropsicólogo, que é geralmente quem faz os testes pra identificar as altas habilidades que o Psicopedagogo já via sinalizadas. Identificada a questão, o Psicopedagogo segue com atividades direcionadas respeitando sempre seu ritmo, sua subjetividade e principalmente suas demandas. Não é porque essa criança tenha uma facilidade considerável em aprender, que devamos tratá-los como miniaturas de adultos. Muito pelo contrário, elas precisam brincar, e brincar de forma lúdica, atraente, motivadora. Aprender brincando sempre é mais interessante.
O mais importante de tudo isso é compreender que estamos lidando com crianças, que precisam brincar, que gostam de brincar, e que esse brincar é extremamente relevante pra seu desenvolvimento.
Andréa Pinheiro– Psicopedagoga, Psicanalista/ Mestranda em Psicanálise, Saúde e Sociedade.
(24)99316-8982 whatsapp   andreapinheiroprof@hotmail.com

O SUICÍDIO NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA.



O SUICÍDIO NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA.





Há algum tempo essa imagem começou a ser veiculada nas redes sociais nos alertando para a catastrófica pesquisa que sinaliza o aumento absurdo de suicídios na infância e na adolescência.  Um par de sapatos para cada criança que se suicidou em 2017. Duzentos e vinte e seis (226) pares de sapatos, duzentas e vinte e seis (226) vidas precocemente interrompidas. O suicídio é hoje a terceira causa de morte na adolescência. Dados os quais preferiríamos não ter notícias certamente, entretanto a advertência é preciosa e precisa ser observada com extrema atenção, olhos voltados para esse público tão jovem que pede socorro, que através desse ato chamam pra si a atenção de algo que a sociedade insiste em continuar não discutindo, “tapando o sol com a peneira”.

As pessoas alarmadas se perguntam “Ué! E criança lá tem razão para se suicidar?”. A resposta é SIM. Crianças e jovens se suicidam todos os dias, com os supostos “acidentes” domésticos, muitas vezes omitido pela família, que apresenta dificuldade e preconceito para lidar com esta difícil questão. E a incidência ainda não é maior entre as crianças devido a maior dificuldade de acesso a métodos letais e imaturidade cognitiva. A criança não dá conta de traduzir em palavras muito do que lhe possa afligir, então ela passa ao ato, morde, bate, grita, chora, chuta, faz pirraça, malcriação, apresenta dificuldades na escola… e se suicida. Verbo fatal. Contra esse último não há o que se fazer, então que prestemos mais atenção quando as crianças ainda estiverem nos “dando trabalho”, porque quanto à isso ainda há algumas tantas e boas saídas, como por exemplo o amor.

Mas o que está acontecendo com nossas crianças e jovens? As razões são diversas, mas entre elas podemos destacar algumas importantes. Mais de 70% das crianças e adolescentes com transtornos de humor grave não apresentam sequer diagnóstico que dirá tratamento adequado. O abandono afetivo e a terceirização da criação dos filhos também aparecem como causa crucial nesse aspecto. Os novos arranjos familiares estão perdidos na criação de suas crianças. O modelo contemporâneo de sociedade imerso no excesso de informações do mundo digital não tem conseguido administrar qualidade x quantidade de tempo com seus rebentos, e o resultado disso não tem sido muito positivo. Perde-se tempo considerável com o supérfluo, deixando de lado o essencial, ou seja, o corpo a corpo tão necessário no acompanhamento do crescimento de nossos pequenos.

Nos consultórios crianças não param de chegar com problemas emocionais, que afetam suas relações e também sua aprendizagem. Sempre digo que precisamos deixar de falar sobre nossas crianças mas conversar com nossas crianças, olho no olho, dando à elas uma escuta pra que essa cena dos sapatos acima não seja mais parte de uma estatística dolorosa, mas apenas um possível catálogo de compras, onde a família possa escolher lindos pares de sapatos pra seus filhos vivos.

Autora: Andréa Pinheiro Bonfante – Psicanalista, Psicopedagoga, Escritora, Pesquisadora, Mestre e Doutoranda em Psicanálise, Saúde e Sociedade.